Num primeiro momento, a notícia causa espanto: ao menos 40 dos 50 Estados americanos podem em breve orientar suas escolas a abandonar o ensino da letra cursiva, aquela que usamos para escrever à mão. A justificativa, conforme publicado na edição de ontem do Destak, é que papel e caneta estão ficando obsoletos; mais importante é preparar as crianças para escrever em computadores e celulares.

O primeiro a reagir é o pai do menino de sete anos que vive os momentos finais de seu processo de alfabetização. Ele foi alfabetizado em letra bastão e é interessante observar como isso é suficiente para que já se mova com desenvoltura tanto no universo da leitura como no da escrita. Além de fazer a carta para o Papai Noel em letra de forma, já escreve usando o teclado do computador e adora mandar torpedos do meu celular. Agora está dando as primeiras voltas na letra cursiva e ele mesmo tem consciência de que são dois momentos distintos de aprendizagem. Não sei ao certo como eu reagiria se me comunicassem que não seria ensinado a ele escrever à mão. No mínimo, com estranheza. Mas a possibilidade desperta reflexões, e isso é bom.

Depois vem a reação do jornalista que acompanha as coisas da educação. É difícil imaginar esse tipo de debate em um país que ainda não assegura uma educação de qualidade a todos os seus estudantes. No entanto, parece óbvio que não podemos esperar fazer o que tínhamos de ter feito no passado para dar os passos na direção do futuro. O mesmo se aplica ao uso do computador na escola (uma tendência irreversível). É preciso corrigir os erros e avançar ao mesmo tempo. Felizmente, há muita gente boa pensando em como utilizar da melhor forma recursos multimídia em sala de aula, inclusive na escola pública.

De tudo isso, ficam duas conclusões. Primeiro, o ensino da letra cursiva, ainda que possa ser importante do ponto de vista social, não deve ser prioritário. Parece-me apropriado que a alfabetização se dê pela letra bastão. A letra cursiva deve ser mesmo quase uma atividade complementar. Segundo, e mais importante, a tradição não é um valor em si mesma e, portanto, não pode ser argumento contra ou a favor qualquer coisa em educação. Tradição é bom enquanto traz benefícios palpáveis. É preciso estar aberto o tempo todo para as inovações, por mais desafiador que isso seja para professores e pais de alunos.

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