1. Relação educador e educando.
O processo de ensino e de aprendizagem no contexto hospitalar transcende o simples ato de apresentar ao educando as letras e os conteúdos pré-estabelecidos. É mais do que prepará-lo para a decifração das artimanhas de uma sociedade que prioriza a competição. É mais do que a incorporação de um saber frio, astutamente construído.
É, na verdade, despertar o gosto e o prazer, balançar o humano adormecido no íntimo do seu ser descobrindo assim a sua essência e, se surpreender ao constatar o despertar da emoção através do seu interesse nos momentos de aprendizagem. Segundo Rubem Alves (2001), "A vida humana não se define biologicamente. Permanecemos humanos enquanto existe em nós a esperança da beleza e da alegria. Morta a possibilidade de sentir alegria ou gozar a beleza, o corpo se transforma numa casca de cigarra vazia".
1.1 Um pouco de uma vivência particular em Classe Hospitalar.
Observar os educandos aguardando ansiosos na recepção pelo momento em que a educadora chega à instituição e inicia o desenvolvimento do planejamento pedagógico; media a construção da aprendizagem e, entrega-se ao prazer do exercício da docência como escolha de ser infinitamente aprendiz. Estas são interações em que prevalecem atitudes colaborativas de novas descobertas tanto pelo conhecimento científico quanto ou muito mais pela vida
e a beleza do existir. Ainda recorrendo a Rubem Alves (2004), "toda aprendizagem se inicia com uma experiência afetiva." Então, a partir desse instante, constato que a inserção de ambientes educacionais e lúdico-terapêuticos nos hospitais contribui de forma ímpar para o enfrentamento das enfermidades tornando-se parte essencial do processo de cura.
Diante de uma experiência (R., 16 anos, 2009), após intervenção médica com saída de um processo do coma (em seu leito da enfermaria); apresento-a à proposta pedagógica do Núcleo de Atendimento Educacional Hospitalar – Hoje. Envolvida pelo ato pedagógico R. é seduzida a participar dos atendimentos educacionais. A princípio, é uma espécie de letargia que aos poucos vai cedendo lugar à vivacidade e ao desejo de aprender. Parecia mágico, mas neste momento e no contexto de uma Classe Hospitalar o processo de ensino e de aprendizagem fluía prazerosamente.
Constato assim que, aprender com prazer é requisito básico para o êxito de todo o processo educativo. O cognitivo é indispensável, mas não essencial. O fascínio do aprender não é, senão, atribuir valor imensurável às vivências das experiências de aprendizagens cotidianas. Insisto em Rubem Alves (2001), quando enfatiza que "os professores devem ensinar com paixão e alegria", porque dificilmente conseguirá transmitir satisfação ou provocar desejo de aprender se não estiver feliz exercendo sua profissão: educar é seduzir para o saber/sabor.
1.2 O Fazer pedagógico.
Segundo Ceccim (1997), "o acompanhamento pedagógico e escolar da criança hospitalizada favorece a construção subjetiva de uma estabilidade de vida não apenas como elaboração psíquica da enfermidade e da hospitalização, mas, principalmente, como continuidade e segurança diante dos laços sociais da aprendizagem (relação com colegas e relações de aprendizagens mediadas por professor)." O contato com o professor e com uma "escola no hospital" funciona, de modo importante; é um elo com os padrões da vida comum das crianças, da rotina de casa e da escola. São momentos de apostar na vida e permitir que o educando se expresse de maneira particular.
O processo de construção da aprendizagem deve acontecer num clima de confiança, incentivo e muita alegria. Alegria da descoberta. Neste clima, há a construção de relações afetivas inseridas à prática pedagógica. O vínculo estabelecido com o educando dinamiza as interações facilitando a comunicação e contribuindo para o desenvolvimento de suas habilidades e competências.
A aprendizagem como elemento propulsor do desenvolvimento ganha novos contornos. Além de resgatar a autoestima e a consciência de cidadania do educando, o ato de aprender gera conhecimentos que contribuem para refletir sobre o momento especial de vida e seu desejo de ser reinserido no contexto social. As ações pedagógicas no contexto hospitalar cooperam para o retorno do educando ao universo escolar sem que haja ruptura no prosseguimento da escolaridade e, estimula-o ao reforçar e valorizar a sua identidade como pessoa e cidadão atuante para a construção de uma sociedade não excludente.
A Pedagogia Hospitalar em sua dimensão humana e pedagógica contribui para que, educador e educando, façam escolhas significativas para a vida, entre elas, saber conviver com as diferenças e contribuir para uma sociedade harmônica e humanizada. Como educadora busco por meio das ações, palavras e gestos, mediar e orientar a construção de aprendizagens; e, intencionalmente, ocorre a integração da pesquisadora, da estudante e aprendiz que durante o atendimento personalizado experimenta a deliciosa aventura proporcionada pela busca do saber.
A aproximação entre a teoria, a prática e a vivência leva ao exercício da reflexão oportunizando um fazer pedagógico renovado; o que provoca o despertar do gosto e da sede em adquirir conhecimentos. O fato de se encontrar num estado de adoecimento não tira do educando a sua capacidade intelectual, nem o seu senso crítico. Portanto, as atividades pedagógicas devem primar pela qualidade. É um desafio estimulante ao crescimento pessoal e profissional.
1.3 Perspectivas.
A partir do real idealizamos o ideal, o possível. Vislumbram-se várias possibilidades de ações que podem ser desenvolvidas em ambientes hospitalares colaborando para a ampliação dos atendimentos educacionais e o atendimento às legislações vigentes que amparam e legitimam o direito do cidadão.
É fundamental a busca constante pela inovação e flexibilização da prática pedagógica para que ela não se formalize de maneira assíncrona, mas sim dialogicamente relacionada às inquietações socioculturais e suas repercussões frente às modificações e inserções dos meios tecnológicos. Neste intuito, a educação em Classe Hospitalar sugere a superação de processos que envolvem o aspecto físico, psíquico e social; sinalizando portanto, um instrumento de inclusão e desenvolvimento qualitativo para uma educação holística (grego "holos" =igual ao todo, do inglês "wholy" = igual ao sagrado. Tendência a ver o todo além das partes).
REFERÊNCIAS
ALVES, R. A alegria de ensinar. 4. ed. Campinas, SP: Papirus, 2001.
______ Ao professor com meu carinho. 5. ed. Campinas, São Paulo: Verus,
2004.
CECCIM, R.B.; CARVALHO, P.R.A. (org.). Criança hospitalizada: atenção
integral como escuta à vida. Porto Alegre: Editora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul,1997.

Perfil e Links:
Especialista em Literatura Brasileira, Docência Superior, Pedagogia Hospitalar e Revisão de Texto(cursando).Licenciatura em Letras - Port./Inglês (UEG), e cursando Licenciatura em Informática. Atualmente trabalha como coordenadora pedagógica do Atendimento Educacional Domiciliar - modalidade do Ensino Especial. Experiência como professora de Língua Portuguesa, Literatura e Artes no Ensino Médio, na rede pública e privada; e, Didática e Prática da Língua Portuguesa para docentes no programa parcelada da Universidade Estadual de Goiás(UEG), polo de Porangatu. Estudo em curso de extensão sobre Práticas em Educação Especial e Inclusiva na Área da Deficiência Mental (UNESP Bauru),Gênero e Diversidade, Educação para as Relações Étnicorraciais (ERER- UFG), e, tutoria sobre Deficiência Mental no contexto da Educação Inclusiva e Atendimento Educacional Especializado (MEC/UEG/UAB).Participação em revisões e correções de textos em bancas e concursos públicos(Cespe/UNB),Supletivo e, seleção de professores para o Núcleo de Atendimento Educacional Hospitalar Hoje (SEE).

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